O ballet “O Lago dos Cisnes”, de Tchaikovsky, é a história de uma princesa que se transforma em
um cisne branco e precisa do amor de um príncipe para voltar à vida humana. O
príncipe promete salvá-la. Porém, ele se apaixona pelo Cisne Negro, que possui um
grande poder de sedução e diz ser a princesa transformada em cisne. O príncipe
percebe o engano, e não podendo voltar atrás, e se suicida. O Cisne Branco,
diante da sua dor, falece.
No filme, Nina (Natalie Portman) é uma bailarina
que recebe o papel principal dessa peça, tendo que representar tanto o Cisne
Branco quanto o Cisne Negro. Aqui, o filme já apresenta a questão da cisão,
quando a mesma personagem irá representar o Bem e o Mal de modo cindido.
A figura do pai não aparece no filme. E a mãe
mostra-se controladora, vivendo em simbiose com a filha. A relação entre ambas
torna-se sádica e masoquista, pois uma vivencia o sintoma da outra. A mãe
sente-se frustrada por abandonar sua carreira como bailarina diante do
nascimento de Nina e projeta nela seu desejo de realização profissional, além
de culpá-la pela impossibilidade de sucesso. A filha, por sua vez, assume essa
posição, buscando a perfeição e o sucesso como bailarina.
Nina é perfeita para representar o Cisne Branco.
Meiga, doce, técnica, perfeita. Mora com a mãe, num quarto cheio de bichos de
pelúcia, demonstrando que sua sexualidade é infantil e imatura. Para conseguir
interpretar o Cisne Negro, ela precisa se conectar com seu desejo e sua
agressividade. Através de um olhar psicanalítico, pode-se aludir que o Cisne
Branco é o superego, a imagem colada ao discurso da mãe: menina meiga. O Cisne
Negro é o Id, o desejo, a busca pela satisfação do prazer. O ego de Nina é
frágil e não consegue mediar o Id e o Superego. O Id aparece, em princípio, nas
coceiras e arranhões quando Nina se fere, e mais tarde, nas alucinações e
delírios devido a forclusão da formação de compromisso psíquico.
Para possibilitar a representação do Cisne Negro, o
diretor Thomas Leroy (Vincent Cassel) provoca o desejo de Nina e a seduz. É a
presença masculina que vem se interpor na relação simbiotizada entre mãe e
filha. Surge, também, a bailarina substituta Lily, que representa para Nina o
Cisne Negro, pois não é tão técnica, nem tão perfeita, porém muito expressiva e
sedutora. A partir desse momento, Nina começa a entrar em contato com suas
emoções e seus desejos. O ódio pela mãe vem à tona, porém torna-se insuportável
devido à culpa. Permite que sua sexualidade seja explorada, mas surgem os
conflitos da imaturidade. Então, o Id que adormecia, torna-se desperto, gerando
um conflito sem possibilidade de mediação para Nina, que possui um ego tão
fragilizado.
Na noite de estréia do ballet, há o desfecho fatal diante
de um ego tão frágil. Na busca da perfeição e de realizar o desejo da mãe, Nina
precisa representar ambos os cisnes. E assim o faz, com perfeição. Porém, ao representar
o Cisne Negro rompe o contrato com sua mãe de filha meiga. Após entrar em
contato com representações insuportáveis para si, Nina não encontrou recursos
psíquicos para sobreviver. Em seu delírio, mata Lily, o Cisne Negro. Entretanto,
percebe que não consegue destruí-la, pois o conflito é interno. Desse modo, a
ruptura torna-se real e ocorre no corpo. O Cisne Branco morre, de fato.
2 comentários:
Claudia,muito legal. Lendo seu texto me lembrei do livro da Joyce McDougall ("As diversas faces de eros"), onde ela fala bastante do processo criativo. Tenho a impressão também de que o filme ilustra bem a relação do artista com sua obra, e dos impulsos agressivos que podem existir nele contra ela. Encarnar o cisne negro permitiu à bailarina dar vazão ao seu lado agressivo, fazendo da personagem uma artista mais completa.
Gostaria de saber se Nina chega a sair com deu diretor de bale Thomaz Leroy
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